Tecnologia

O problema não é o artigo do Marco Civil da Internet e sim a regulação das big techs. Por Pedro Zambarda

Por Pedro Zambarda, editor-chefe.

Para esclarecer os leitores: Eu fui assessor de imprensa do Comitê Gestor da Internet do Brasil na época da aprovação do Marco Civil da Internet. Por essa razão, o leitor precisa saber que o autor este texto não é neutro. Em segundo lugar, o leitor deve saber que eu não sou um operador do Direito, mas entendo alguns detalhes da Lei 12.965/2014.

Lei considerada internacionalmente como a “Constituição da Internet”. Com a onda de fake news e desinformação na internet, o Supremo Tribunal Federal, o STF, está julgando a validade do artigo 19 do Marco Civil da Internet. Para começar a discutir o assunto, é necessário entender o que diz o artigo.

Artigo 19 da Lei 12.965 afirma o seguinte:

Art. 19. Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário.

O STF está votando se o artigo é constitucional ou não. Dois ministros, Dias Toffoli e Luiz Fux, votaram pela inconstitucionalidade. Ou seja, condicionar a retirada de conteúdos somente às ordens judiciais, para os juízes, não é o suficiente para evitar a desinformação e as fake news em redes. Toffoli fala em “imunidade das redes sociais”.

O presidente da Corte, Luis Roberto Barroso, deu um voto diferente: “Eu entendo que crimes contra a honra dependem de ordem judicial para remoção, não crio responsabilidade objetiva, substituo a ideia de monitoramento ativo pelo dever de cuidado e não incluo qualquer obrigação adicional para marketplaces”.

Barroso defende o endurecimento contra conteúdos de pornografia infantil, suicídio, tráfico de pessoas, terrorismo e ataques à democracia. Já o ministro André Mendonça pediu vistas no julgamento, jogando sua deliberação para fevereiro de 2025.

Dos três votos proferidos, o de Barroso parece ter uma abordagem crítica no ponto certo, entendendo sua parcialidade constitucional. O problema, no entanto, é anterior aos ministros e à Suprema Corte.

Há um PL que resolveria o problema

Durante o julgamento, a big tech Google saiu em apoio do Marco Civil da Internet. A advogada Flávia Lefèvre, que foi representante do Terceiro Setor no Comitê Gestor da Internet no Brasil, apontou corretamente: O Google não deveria se manifestar sobre essa matéria.

Palavras dela:

As plataformas [digitais] fizeram tudo, inclusive o q não deviam, para interditar a aprovação do PL 2630, sobre Liberdade, Transparência e Responsabilidade na Internet, q trazia regras equilibradas e razoáveis sobre moderação de conteúdos

Perderam, portanto, respaldo e legitimidade para criticar os votos que vêm sendo apresentados no julgamento da constitucionalidade do art 19 do MCI.

O PL 2630, chamado por parte da esquerda de “PL da Globo”, por ter sido apoiado pela Rede Globo, e de “PL da censura” pela extrema direita, resolveria o problema debatido hoje no Supremo. O Marco Civil da Internet foi construído em debate público como uma série de leis para o funcionamento da rede online.

Para regular plataformas de tecnologia, é necessária uma regulação específica, assim como existe uma lei de proteção de dados. A construção de legislações precisa ser acima de uma cartilha de uso da internet.

E a supressão do artigo 19 do Marco Civil da Internet é, na ponta do lápis, um ataque à liberdade de expressão. Então, através de uma decisão da Justiça, todos corremos um risco.

O jornalista Breno Altman, do site Opera Mundi, fez esse alerta em 29 de novembro deste ano no X/Twitter.

Ameaça à liberdade de imprensa está em curso no STF. Pode ser abolido o art. 19 do Marco Civil da Internet, passando-se a responsabilizar as plataformas por conteúdo de terceiros e autorizando sua retirada sem decisão judicial. Seria sinal verde contra a imprensa independente.

Breno é militante pela causa palestina, sendo um judeu antissionista. Ele entende, o que muitos não entendem, que forçar as plataformas a filtrar conteúdo antes de decisão da Justiça significa suprimir conteúdos sobre massacres de minorias, de populações que estão resistindo a um genocídio.

O assunto está passando meio batido no noticiário. Mas uma decisão errada da Suprema Corte pode representar um grande retrocesso na liberdade de expressão. O PL 2630 deveria ter sido regularizado.

É necessária uma lei que regularize o funcionamento do Google, do Facebook, do Instagram, do X/Twitter e das suas empresas correspondentes.

A liberdade de expressão do internauta não deveria ser o foco de suas excelências.

Os ministros do STF. Foto: Divulgação/Montagem Pedro Zambarda/Drops de Jogos

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Pedro Zambarda

É jornalista, escritor e comunicador. Formado em Jornalismo pela Faculdade Cásper Líbero e em Filosofia pela FFLCH-USP. É editor-chefe do Drops de Jogos e editor do projeto Geração Gamer. Escreve sobre games, tecnologia, política, negócios, economia e sociedade. Email: dropsdejogos@gmail.com ou pedrozambarda@gmail.com.

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