Publicado originalmente no perfil de Facebook do autor
A Brasil Game Show é, sem dúvida alguma, o mais importante evento de games dentro do território brasileiro e não é preciso ranqueá-la em relação à America Latina ou mesmo em relação ao resto do mundo. Ela é uma feira de entretenimento, voltada para os jogos digitais e como tal é direcionada ao público consumidor (lembra dele?). Quem vai na BGS vai para ver jogos e, dando uma banana para a tal crise, gastar dinheiro (muito dinheiro).
Portanto, se alguém está pensando que ir na BGS é para “aprender”, fazer negócios, ou conhecer melhor o mundo do desenvolvimento de jogos, pode ir deixando essa ideia de lado. No entanto, a própria feira se mostra como uma universidade aberta, com ensinamentos que nenhum curso de jogos irá lhe fornecer. Tudo grátis e tudo disponível para aqueles que souberem “ver” além das luzes coloridas, dos cosplays incríveis e das filas para jogar “aquele joguinho”.
O grande ensinamento de uma feira como a BGS é que o mundo dos negócios não é para iniciantes e muito menos para inebriados com seus primeiros resultados, pilotando uma engine de última geração. É um mundo frio, calculado milimetricamente para fazer o consumidor (olha ele aqui de novo) colocar a mão na carteira e puxar o cartão de crédito. Você não anda muito sem ter alguém lhe puxando para ver um lance, uma promoção, dar seus dados, cadastrar uma foto no insta etc. Arrisco dizer que dá pra evitar muitos, mas escapar de todos é impossível.
Uma observação a ser feita é que esse comportamento inexiste quando a gente foca a produção indie. É quase como se esse tipo de produção requeresse a aceitação apenas pela sua presença: existo logo sou … (complete o espaço com a palavra que achar mais apropriada). Isto não quer dizer que não seja importante estar presente ou fazer todos os esforços (inclusive os financeiros) para estar lá. Apenas estar presente já é um ensinamento importante e ajuda o setor como um todo.
Ainda assim é preciso atenção aos detalhes. Por exemplo, os grandes nomes do mercado, além de marcar presença com grandes espaços chamativos por si só, levam seus produtos top com dois objetivos: consolidar a sua fatia de mercado e não deixar o concorrente sozinho, tentando seduzir o consumidor. Dificilmente serão vistos os jogos br que, mesmo estando sob o guarda chuvas de um nome master top, não tem o mesmo potencial de impactar a multidão. Isso é a coisa mais natural do mundo mas podia ser ligeiramente diferente (enfim, a feira não é minha).
Outra observação pertinente é que aquilo que chamamos de “industria de jogos” não é composta apenas por games e empresas mas por um conjunto de “coisas” que se interconectam, como por exemplo os grande nomes da área. Eles estão lá para vender a ideia de que tudo é muito legal e que matar a saudade, principalmente da adolescência, é uma forma de preservar o consumo.
Neste quesito uma observação derivada, para reflexão, é possível. Nesta BGS, como de costume, estiveram presentes grandes nomes do desenvolvimento de jogos, pioneiros (hard e soft), dubladores, músicos, etc. Um show de talentos internacionais, com uma produção esmerada. Mas o espaço de destaque para presença nacional, genuína, raiz, dessa gente talentosa que há anos se dedica ao desenvolvimento de jogos acaba se resumindo a um Caldeirão do Huck. Cabe a pergunta: é isso que temos para mostrar não apenas ao mundo, mas ao nosso próprio mercado consumidor (depois não adianta reclamar que brasileiro não compra jogo brasileiro ou que grandes eventos não dão retorno).
Em tempo: amigos, não fiquem bravos comigo. É apenas a minha opinião e como tal pode estar totalmente equivocada (o que não seria de se estranhar).
Renato Degiovani é o primeiro game designer de jogos digitais, desde 1981. É colunista do site Drops de Jogos no espaço DEV.LOG, com textos regulares sobre sua experiência de décadas. Foi o desenvolvedor do jogo Amazônia, é conhecido na comunidade nacional do aparelho MSX, editou a revista Micro Sistemas e é responsável pelo espaço TILT Online.
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