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O edital da Ancine não é a oitava maravilha do mundo, mas… Por Renato Degiovani, colunista do Drops de Jogos

Se você está lendo este post, é da área, ainda não se inteirou dos detalhes e tem vontade de embarcar nessa canoa, minha recomendação expressa, em maiúsculas: LEIA O EDITAL PELO MENOS 10 VEZES. Se possível peça ajuda para um advogado e se puder um que entenda pelo menos o que é um produto digital.

Atente para o detalhe, logo no primeiro parágrafo dos objetivos, para não ficarem dúvidas:

1.1.1. Seleção, em regime de concurso público, de propostas de produção de jogos eletrônicos para exploração comercial em consoles, computadores ou dispositivos móveis, visando à contratação de operações financeiras de investimento.

E logo em seguida:

2.1.1. Poderão apresentar propostas empresas que tenham solicitado para a ANCINE o registro de AGENTES ECONÔMICOS BRASILEIROS INDEPENDENTES, nos termos da Instrução Normativa…

Ou seja, é um edital para empresas da área que objetivam a atuação no mercado comercial de games. Não é pra desenvolvedor solitário ou grupos de amigos, etc. Se você não se enquadra na categoria empresa, ou não faz parte de uma, pode esquecer.

Existem detalhes técnicos no edital que obrigarão o pretendente a pensar inclusive em termos de registro de marcas e patentes e a considerar a conveniência de 15 anos de “parceria” após o lançamento do produto. Sim, meu caro, não é dinheiro a fundo perdido não. Vai ter sócio no faturamento do jogo.

Um dos motivos de crítica foi a divisão do bolo de 10 milhões em 2 jogos de 1 milhão cada, 10 de 500 mil e 12 de 250 mil. Quanto a isso não há o que discutir, não apenas porque não irá mudar em nada o que já está definido, mas principalmente porque não existe uma fórmula que agrade a todos. É preciso ler com calma todo o edital para entender que o propósito é o de produzir um jogo e não constituir uma empresa. Se você está no time dos "vamos fazer uma empresa para concorrer" pode acabar tendo uma surpresa desagradável no final do processo.

Outro ponto controverso e que é até compreensível (mas não justificável) é que na obrigação dos CNAE, foram incluídos estúdios cinematográficos, estúdios de produção de filmes publicitários e até de estúdios de produção de programas de televisão. Ok, é a Ancine que está promovendo. Mas ao mesmo tempo, abriu-se espaço pra gente que não é do ramo e é aí que o bicho pega.

Entenda uma coisa: ninguém está dizendo que um estúdio que produz filmes e/ou audiovisuais não possa reunir uma equipe com competência para produzir um jogo. Mas produzir um jogo não é nem de longe a mesma coisa que produzir um filme. A restrição deveria ser apenas para empresas de produção de software. Se um estúdio cinematográfico quiser participar, então que inclua o CNAE na sua estrutura e/ou crie uma "divisão" de produção de jogos.

Por mais simpática que seja a afirmação de que "tudo é audiovisual, interativo ou não" não é bem assim que a banda toca – são produtos diferentes (filme/jogo); são comercializados de forma "muito" diferente e coloco uma ênfase bem grande nesse "diferente" e acima de tudo são processos produtivos completamente diversos, embora no final ambos se pareçam muito com produções culturais de audiovisual.

O terceiro ponto que destaco é referente aos requisitos de qualificação de quem vai participar da produção e ficou muito claro que esses profissionais já devam fazer parte do quadro de funcionários da empresa ou já estão sob contrato específico de trabalho. Ponto para os programadores, artistas digitais e game designers.

Olhando para o conjunto da obra, fica difícil não gostar da iniciativa. Mesmo mantendo certa distância por ela vir de um setor que pretende encampar a produção e comercialização de games. A pergunta que fica para os profissionais da área é: queremos isso ou a partir desses editais e dessas experiências vamos conquistar a nossa própria agência?

Em tempo: Ficou de fora do edital qualquer menção ou interferência em relação ao conteúdo. Isso não é bom nem ruim. Pessoalmente eu iria preferir um texto mais alinhado com cultura nacional, voltada principalmente para produções visando o mercado local por conta de todas as dificuldades que temos neste segmento.

Se, ao contrário, formos olhar apenas para o mercado mundial, com todas as suas expectativas de sucesso e facilidades, então vale a pena perguntar: precisamos mesmo desse dinheiro com todas as implicações que ele traz nas entrelinhas?

Renato Degiovani é o primeiro game designer de jogos digitais, desde 1981. É colunista do site Drops de Jogos no espaço DEV.LOG, com textos regulares sobre sua experiência de décadas. Foi o desenvolvedor do jogo Amazônia, é conhecido na comunidade nacional do aparelho MSX, editou a revista Micro Sistemas e é responsável pelo espaço TILT Online.

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