O jogo de estupro de mulheres no Steam mostra a ideologia de extrema direita no mercado. Por Pedro Zambarda - Drops de Jogos

O jogo de estupro de mulheres no Steam mostra a ideologia de extrema direita no mercado. Por Pedro Zambarda

O jogo No Mercy e a balela nociva dos “anti-woke”

O jogo de estupro de mulheres no Steam mostra a ideologia de extrema direita no mercado. Foto: Divulgação/Drops de Jogos

O jogo de estupro de mulheres no Steam mostra a ideologia de extrema direita no mercado. Foto: Divulgação/Drops de Jogos

Por Pedro Zambarda, editor-chefe do Drops de Jogos.

Vou poupar o leitor das imagens do jogo de videogame No Mercy, que viralizou nesta sexta (11). O repórter Rafael Silva publicou dois textos bem apurados sobre o assunto. Eu vou politizar essa discussão, dar mais densidade e, pretensamente, apontar possíveis responsáveis.

A indústria dos games sempre lidou com violência e com gatilhos de conflito, uma vez que sua tecnologia se desenvolveu do complexo militar americano. No entanto, enquanto a extrema direita trumpista (e boa parte da bolsonarista, claro) embala discursos “anti-woke”, contra minorias diversas, pretos e mulheres, a indústria se afunda em lixos de extrema direita. Um game para encenar estupro é o que faltava para coroar a insensatez de um mercado guiado apenas por números, cifras e vendas.

Videogames possuem o potencial cultural não apenas de serem jogos de tiro, ação e protagonizados por meninos. O jogo eletrônico é uma página em branco. Ele pode ser uma mídia de emancipação feminina, periférica e diversa. Ele pode conter mecânicas para agregar ao invés de agredir.

E, no entanto, deliberadamente, há desenvolvedores empenhados no pior tipo de agressão: A agressão sexual contra mulheres, inclusive dentro da família dita conservadora e tradicional.

Masculinismo, redpill e a base da extrema direita

O ódio às mulheres e aos marginalizados pela sociedade gera, entre movimentos que se denominam conservadores, o movimento de “retomada da masculinidade”. E, nessa linha, temos a série Adolescência na Netflix, que extrapola o masculinismo para o crime cometido por um menor de idade.

Essa é a base da extrema direita, uma ideologia ressentida, embalada por uma abstração e empenhada contra uma suposta agenda esquerdista “woke” que está infiltrada na indústria cultural – quando as minorias entraram nos games por razões comerciais.

É uma modalidade de doença social, que fundamenta candidaturas políticas profundamente identificadas com o homem cis hétero.

E quando surge um game estimulando o estupro de mulheres no Steam, não é mais caso de liberdade de expressão. É sintoma de uma sociedade que precisa refletir.

Não é pânico moral, não é moralismo e nem o “politicamente correto”.

Acredito que cruzamos uma linha nesse produto que é sim importante na economia criativa.

Em tempo: O autor do texto não é contra jogos de tiro e violência per se. Mas acredito que a indústria já evoluiu o suficiente para empregar mecânicas e roteiros que sejam inclusivos de fato. E isso é sim uma discussão também para os homens do setor. Temos alguns de nós enxergando ludicidade no estupro puro e simples.

O jogo de estupro de mulheres no Steam mostra a ideologia de extrema direita no mercado. Foto: Divulgação/Drops de Jogos

O jogo de estupro de mulheres no Steam mostra a ideologia de extrema direita no mercado. Foto: Divulgação/Drops de Jogos

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** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal UAI.

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Johan Capibara

Copiando e colando o comentário que coloquei no seu vídeo sobre o assunto no Meteoro, pois eu realmente preciso que vocês vejam.
—–
Olha, eu vou ser honesto aqui, esse vídeo é extremamente decepcionante. Muita fala, e absolutamente *nenhuma prova* de que o jogo foi feito com intuito de promover abuso, e nem prova de que jogos podem induzir alguém a cometer um crime, até porque não existe prova pra isso.
Vocês demonstraram um entendimento muito mal de como fantasias (especialmente as sexuais) funcionam, ao acreditarem que fantasias são sempre sobre a realidade e sempre literais.
Esse vídeo é emblemático de um pânico moral que infelizmente se tornou popular na Esquerda, e que já era popular com os conservadores e fascistas (e eu digo isso como alguém que se identifica como de Esquerda (libertária) ) – o pânico de que ficção representa a realidade e que, por isso, ficção é indicativo de desejos e intenções reais, que ficção pode normalizar comportamento maléfico.

O que está acontecendo nesse vídeo é que vocês estão lembrando da situação real e literal de abuso e projetando as emoções originárias dessa memória ao conteúdo fictício. Só que ficção é só personagens (ou seja, bonecos mentais que não tem mente ou vontade própria – que não são sencientes) encenando uma performance (por isso que assassinato fictício não deixa ninguém de fato morto, pois é só uma performance. Mesma lógica se aplica a qualquer outra coisa fictícia). E como personagens são só bonecos, fantasiar sobre personagens não é a mesma coisa que fantasiar sobre pessoas.
Ficção pode ser até ser *potencialmente* (palavra-chave) usada para comunicar uma mensagem sobre a realidade, mas não existe isso de ficção funcionar como substituto de algo real.

Se você não acredita em mim, então responda essas perguntas:
> Você trocaria sua moradia por uma casa fictícia (tipo um desenho de uma casa)?
> Você acha que dá pra roubar um banco usando um desenho de uma arma?
> Se você tá com fome, você vai comer comida ou desenho de comida?
> Você trocaria seus amigos e entes queridos por desenhos?
> Você já ligou para a polícia para denunciar um crime cometido no enredo de uma novela?
> Você aceitaria uma cena de desenho animado como prova em vídeo (como equivalente a gravação de uma câmera) de que alguém cometeu um assassinato ou estupro?

Sabe, eu também já acreditei nesse pânico moral de que ficção representa a realidade, e eu também fazia essa exceção bem arbitrária para jogos de tiro. Só que os fascistas não vão se importar com essa exceção arbitrária, vide algo que o próprio Trump falou: https://www.nbcnews.com/politics/donald-trump/fact-check-trump-suggests-video-games-blame-mass-shootings-n1039411

Pois fascismo é fundado na negação da distinção entre realidade e ficção/fantasia, então quando vocês espalham esse pânico moral, vocês estão alimentando o fascismo (mesmo que não seja essa sua intenção). Parte da negação entre realidade e ficção é justamente a negação de que arte não tem significado objetivo e inerente.
É assim que os Nazistas conseguiam acreditar que somente pessoas más criavam a arte que eles consideravam ‘degenerada’ (https://encyclopedia.ushmm.org/content/en/article/degenerate-art-1), então ouvir esse papo vindo de vocês é bem alarmante.
E se você não acredita que esse pânico é algo que vem bastante da Direita, aqui, um monte de exemplo: https://www.fujoshi.info/censorshipandconservatism
Conservadores e fascistas constantemente objetificam pessoas ao clamarem que eles podem se tornar criminosas se consumirem a ficção errada, a arte considerada degenerada, como se não tivessem capacidade de pensamento próprio.

Esse papo de que ficção deve ser um guia da realidade é coisa de nazista/fascista, lembram daquele ministro do Bolsonaro que citou Goebbels, falando que arte devia ser ‘heroica’ e ‘imperativa’ (ou seja, de acordo com a visão de realidade dos nazis)? Eu lembro: https://g1.globo.com/politica/noticia/2020/01/17/secretario-nacional-da-cultura-roberto-alvim-faz-discurso-sobre-artes-semelhante-ao-de-ministro-da-propaganda-de-hitler.ghtml

E fantasias sobre personagens fictícios não são um problema, pois elas não são literais, por natureza. Inclusive, o ponto de tais fantasias é justamente pegar elementos de algo real negativo, e colocar esses elementos no ambiente seguro e controlado de ficção. É um processo de recontextualização/resignificação, pegar algo que é negativo e transformar em positivo, é uma forma de empoderamento, e empoderamento pode ser bem sexy.
Explicação de uma psicóloga sobre isso (comentário linkado com fontes): https://www.youtube.com/watch?v=4deRExKXDE0&lc=UgymoKXXDezp1JV1Ult4AaABAg.9muCekzjLQB9mxzwDfNX9v

Aqui, uma coletânea de vários recursos explicando como fantasias tabu funcionam: https://x.com/purity_culture/status/1614285461639364609
E aqui, uma coletânea mostrando a ligação de Antis (nome dado para o pessoal que acredita nesse pânico) com TERFs e sentimento anti-trans.
E aqui, uma superpágina que demonstra o comportamento abusivo de Antis (incluindo falando pra vítimas de abuso sexual que elas mereciam ter sido abusadas). Essa superpágina também desconstrói em detalhes todos os argumentos de Antis. https://www.fujoshi.info/antifan-archive
Aqui, uma palestra pela pessoa que criou o fujoshi.info: https://www.youtube.com/watch?v=VsKqat6tMho

Ah, e ficção é inerentemente não-literal, pois percepção funciona há base de contexto. A forma como você processa elementos visuais, sonoros e etc depende do contexto em que se encontram. Exemplo: https://x.com/JohanCapivara/status/1880740410064265467.
E aqui, um artigo para te introduzir ao assunto: https://www.psychologytoday.com/us/blog/achievements-the-aging-mind/202107/the-role-context-in-perception
E pra se aprofundar no assunto de percepção ser contextual (e também construída), olhem o trabalho da neurocientista Lisa Feldman Barrett. Aqui, um vídeo que traz uma síntese: https://www.youtube.com/watch?v=0rbyC5m557I

E talvez tenham percebido que esse Johan Capivara aí que eu linkei, sim, é eu. Convido vocês a olhar o meu twitter pra ver se vocês vão achar alguma postagem anti-LGBTQ+, ou reclamando de jogos serem woke. Não vão achar.

Bem, falei o que tinha pra falar. Espero que esse comentário seja o suficiente, se não for, então o vídeo que estou fazendo sobre esse pânico moral em inglês vai ter que sair em português também.

https://www.youtube.com/watch?v=blAGQdhe0FY&lc=UgxWgp0e4uLaFMSRfsx4AaABAg