Acabo de ler no Gamasutra um texto comentando sobre os jogos recentemente lançados, sobretudo pela desenvolvedores independentes, cuja estética ou condução baseiam-se nos jogos clássicos de 8 bits ou menos.
Embora este fenômeno não seja exatamente novo, vem apresentando número crescente de lançamentos, a ponto de chamar a atenção da mídia especializada, que vem qualificando o expediente como uma espécie de movimento “Neo-Retrô”.
Na opinião de Nayan Ramachandran, o articulista que assina o texto, o Neo-Retrô pode ser definido como “um game cujas convenções mimetizam aqueles de gerações anteriores, sem ter realmente existido na época”.
Embora a premissa do texto esteja clara e esta linha conceitual faça jus ao desenvolvimento da ideia ali apresentada, tomo a liberdade de emprestar o termo e ampliá-lo, entendendo que pode ser estendido outros jogos, hoje poligonais, que sendo frutos de franquias mais antigas, bebem na fonte de origem para aproveitar a onda (saudosista?) do momento.
Ramachandran cita como exemplos o muito interessante Game Centre CX (http://namco-ch.net/gamecenter_cx/index.php), baseado no programa de tv japonês que leva o mesmo nome, e o já exaustivamente comentado Megaman 9 (http://megaman.capcom.com/). Game Centre apresenta uma série de situações que correspondem a ações típicas de games de gerações passadas e Megaman 9 parece ter saído diretamente em cartucho para o seu Master System, tantas são as óbvias referências ao capítulo 2 da franquia.
Porém, vejo iniciativas como Space Invaders Extreme e Pac Man Championship Edition para Xbox, perfeitamente pertinentes, embora em ambos os casos tenhamos uma certa apropriação de estilo contemporâneo de arte digital em suas interfaces e jogabilidade, mas esta “mudança” me parece completamente diferente da atualização ocorrida com Solid Snake ao longo da série Metal Gear Solid ou da tridimensionalização de velho Jumpman de Donkey Kong para Mario 64, para ficar em apenas dois exemplos.
E não consigo deixar de fora também a brilhante sacada (em minha modesta opinião) de Marvel Ultimate Alliance, que apresentava uma sequência em homenagem a Pitfall na forma de um meta-game, dentro de um arcade no ambiente do jogo.
De certa forma, este texto pode ser visto como uma continuação da artigo “Para onde vai o game velho?“, postado aqui mesmo no GC recentemente, mas vem desta vez como uma indicação de resposta, ao invés da indagação daquele título, pois mostra como a estética de 2, 4 e 8 bits se mantém instigante e atrativa ao público gamer, mesmo nesses tempos de hi res.
Embora não seja nova, a proposta dos neo-retrôs vem angariando novos públicos, inclusive em significativa parcela de jogadores que nasceram depois da chegada destas plataformas ou até mesmo de seus ocasos e que cresceu em meio aos poligonais hiper-realistas.
Mas lembro que as primeiras iniciativas nesse sentido datam de quase uma década atrás, quando as plataformas de 64 bits já estavam se consolidando. O melhor exemplo fica com meu preferido Captain Low Rez (http://www.newgrounds.com/portal/view/218059). Se você não conhece nem perca tempo com este texto, vá jogar esse clássico do neo-retrô!
Além do jogo, assista aos divertidíssimos episódios, que brincam com as limitações estéticas e técnicas dos primeiros consoles e seus jogos. É uma sedutora homenagem ao passado e já apontava caminhos para o movimento que se manifesta agora.
É claro que esta onda foi favorecida também pelo lançamento de gadgets que se apropriaram muito oportunamente do charme elementar destas limitações. Estes equipamentos, os celulares e handhelds, foram naturalmente se aprimorando, aumentando a capacidade de processamento e a qualidade da apresentação gráfica, mas nem por isso deixaram de lado os games bidimenssionais.
Embora as implementações tecnológicas permaneçam como elemento condutor e norte da indústria de games, alguns aspectos parecem justamente contrapor esta característica com uma mudança de foco: ao invés de se auto-fagocitar, sempre com recriações que pulverizam as qualidades de lançamentos anteriores, esta indústria começa a se retro-alimentar, aproveitando a longevidade e o poder de atração de ícones por ela mesma criados e que foram capazes de vencer o desgaste expositivo da mídia e a sede de novidades do mercado, tornando-se, em muitos casos, verdadeiros bens culturais de apelo crescente fora do circuito gamer.
É justamente este apelo que estabelece uma relação mais carinhosa e longeva entre os jogos antigos, seus personagens e o grande público.
Em artigo online de 2005 para a Wired (http://blog.wired.com/games/2007/04/browser_game_co_1.html), David Kushner já observava que “todo mês de maio as empresas [de game] apresentam seus novos lançamentos [na E3]. A Sony [mostrou] uma versão em alta definição de Gran Turismo… Miyamoto… conduziu uma orquestra com o controle do Wii… mas o maior alvoroço veio quando a Microsoft revelou que alguns títulos com 25 anos de idade – Frogger, Defender e Galaga – estariam disponíveis para download. Porque os gamers estão festejando como se fosse 1979?
Estes velhos arcades fundamentais ainda são divertidos em sua simplicidade e objetividade e agora a distribuição digital os está transformando em artigos fáceis de comprar por impulso”.
Na minha humilde opinião, Kushner cita tudo o que é importante ao dizer “ainda são divertidos”. Afinal, por que razão temos algum interesse no jogo? Pela perspectiva de diversão, mais do que qualquer outra coisa, visto que ninguém tem interesse em gastar seu tempo com coisas realmente muito chatas, sejam reuniões de síndico, parentes bêbados ou games sem graça.
Na rede as opiniões parecem divididas em relação ao tema. O colunista Soulskill, do Slashdot (http://games.slashdot.org/article.pl?sid=08/11/08/0259222&from=rss) pergunta: “poderão os neo-retro jogos suportar o teste do tempo? Os jogos que imitam ou satirizam a era de 8 bits continuarão relevantes e interessantes às massas depois que o publico original tiver desaparecido?”
Já o site Lostgarden (http://lostgarden.com/2005/06/neo-retro-art-style-savior-of-game.html) se inflama ao afirmar que “é hora de combater os males econômicos dos excessos da geração seguinte com uma poderosa arma secreta: estilo; retro-estilo” e define o neo retrô como uma arte que tem “suas raízes nos gloriosos dias dos 8 bits, pega emprestada a simplicidade dos jogos de tabuleiro de outrora e a mescla com a estética minimalista e brilhante do cultuado design [estilo] Ipod”.
Independente da vertente de opiniões, o movimento neo-retrô, parece começar a existir de fato e vem para confirmar a retomada vitoriosa desta estética e qualidade destes novos trabalhos, bem como o prazer dos usuários em jogar mais uma vez os velhos clássicos ou seus representantes contemporâneos.
É claro que na sua maioria são jogos casuais, sem roteiros tão elaborados quanto um Half Life (embora haja verdadeiros RPGs na melhor linha Dragon Quest!) ou a jogabilidade complexa de um Bioshock, mas isso não lhes tira absolutamente o mérito, ao contrário, é quase como uma pausa para um merecido recreio entre um mega-jogo e outro e um excelente caminho para reunir velhos saudosistas com consoles atuais, iniciar os mais novos e alcançar os (ainda) não-jogadores.
Há um movimento neo-retrô para os games? Eu apoio.
P.S.: Aproveito a deixa final para comentar brevemente Retro Game Challenge (http://www.retrogamechallenge.com/ ), para Nintendo DS e que vai na mesma linha dos demais retrôs citados no artigo. Confira!
Atualização: Curioso reler um texto surgido mais de dois anos antes de Minecraft e ainda antes da explosão de Roblox pelo mundo e ver como o público parecia realmente ansiar por novos jogos com boa mecânica e visuais inspirados no passado. Algumas das iniciativas aqui apresentadas já não existem mais, mas o apelo do artigo continua bastante atual.
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