Demolidor: Renascido é o sopro de vida que a Marvel precisava - Drops de Jogos

Demolidor: Renascido é o sopro de vida que a Marvel precisava

Série da Disney+ combina a profundidade emocional da versão da Netflix com a capacidade de replicar o sentimento de ler um quadrinho daquele jeito que só o MCU consegue.

Demolidor: Renascido. Foto: Divulgação/Montagem Pedro Zambarda/Drops de Jogos

Demolidor: Renascido. Foto: Divulgação/Montagem Pedro Zambarda/Drops de Jogos

2025 é um ano crítico para o futuro do MCU (Universo Cinematográfico Marvel), e a primeira “prova de fogo” era a reação do público para com Demolidor: Renascido. 

A série era um desafio triplo para a Marvel: seria o primeiro lançamento no Disney+ de um de seus personagens mais populares (nos últimos 30 anos, o Demolidor meio que só perde pro Homem-Aranha, X-Men e Vingadores em popularidade nos quadrinho); seria o primeiro conteúdo de super-heróis com classificação +18 feito especificamente para o streaming (e segundo no geral, já que o primeiro foi Deadpool & Wolverine ano passado); e precisaria pelo menos manter o padrão de qualidade da versão original da Netflix.

E a cúpula da Marvel/Disney sabia de tudo isso. Tanto que o conceito original da série – um drama jurídico de 18 episódios – foi cancelado quando várias gravações já tinham ocorrido, e todo o conceito foi revisto do zero.

E, sinceramente? Foi uma decisão acertada. No fim, Demolidor: Renascido talvez seja a melhor série já produzida pela Marvel, melhor até mesmo que Wandavision e Loki. 

Atenção: a partir daqui o texto contém spoilers de Demolidor: Renascido.

A linha tênue entre origem e continuação em Demolidor: Renascido

Um dos maiores desafios da série era uma linha tênue na qual ela precisava andar. Afinal, Demolidor: Renascido precisava ser uma continuação dos eventos que ocorreram nas três temporadas de Demolidor da Netflix. Mas, ao mesmo tempo, também precisava ser uma história de origem do herói dentro do MCU, apresentando o personagem para quem não acompanhou a série da Netflix.

Assim, o nome Demolidor: Renascido era perfeito para indicar essa nova era do personagem. Afinal, ele não só deixava claro que deveríamos esperar o renascimento do Demolidor, como era um nome calcado na tradição (Born Again é um dos arcos de histórias mais famosos do herói nos quadrinhos).

Mas o nome é também, ao mesmo tempo, um tanto falso e enganoso. Porque a única certeza que tínhamos era que essa nova história não iria adaptar o arco Born Again dos quadrinhos. E essa certeza existia no fato de que este arco foi a base das três temporadas da série na Netflix. Então, o nome era menos uma indicação de narrativa e mais um indicação de conceito: nós veríamos Matt Murdock (o Demolidor) chegar ao fundo do poço e “renascer” como o herói que conhecemos.

E é justamente por esta jornada que a série nos leva: nós vemos Matt passar por um evento traumático que faz ele basicamente abandonar toda sua antiga vida e se tornar uma outra pessoa. Mas ao longo da série vamos percebendo que aquilo não é uma transformação real, mas um reflexo de trauma. E, no fim, Matt finalmente aceita que o Demolidor não é uma fantasia, mas uma parte dele como pessoa. E, então, o renascimento acontece.

E um dos conceitos mais importantes da série é a ideia do espelho: seja ela a de não se reconhecer ao olhar para um, seja a de lidar com um reflexo de nós mesmos em outra pessoa. E esse reflexo de Matt é trabalhado na figura de Wilson Fisk, o Rei do Crime. Ele retorna a Nova York querendo ser uma “pessoa melhor” e jurando “proteger” a cidade daqueles que querem destruí-la.

Mas ao mesmo tempo que Matt passa por uma jornada de redescoberta, Fisk vive uma jornada de manipulação. Enquanto Matt se esforça para se tornar alguém melhor do que um cego mascarado que sai pulando de prédios e descendo a porrada em bandidos, Fisk está numa campanha para provar à cidade que ele não é o Rei do Crime, mas um cidadão preocupado com a onda de violência que vitimiza a cidade.

No fim, nós redescobrimos aquilo que sempre soubemos: que Matt nunca deixará de ser O Homem Sem Medo, e Fisk nunca deixará de ser o Rei do Crime. E Demolidor: Renascido termina com um momento meio O Império Contra-Ataca: nossos heróis “mortos de overdose”, e os inimigos estão no poder. E com um baita de um gancho para a segunda temporada que já está confirmada e deve chegar no começo do ano que vem.

As qualidades superam qualquer problema

Isto não quer dizer que Demolidor: Renascido é uma série perfeita. Claro, ela tem seus problemas – mas nenhum deles tão absurdo que supere os bons momentos.

Acho que o principal deles é o sentimento de “estranheza” que perdura durante os primeiros sete episódios. Não que eles sejam ruins – longe disso. Mas você sente que tem algo “estranho” neles, como se tivessem sido costurados e remendados e faltasse algo na essência de tudo ali.

E se você ficou com essa impressão é porque sim, eles foram mesmo costurados. Os primeiros sete episódios da série foram basicamente feitos na ilha de edição, pois são montados por pedaços e cenas gravadas da primeira versão da série – aquela que deveria ser um drama jurídico – com algumas poucas regravações, que servem para unir os pontos desconexos.

Mas isso não quer dizer que esses episódios não possuem pontos altos – o quinto inclusive é um dos mais divertidos de toda a série – mas eles nunca deixam de parecer uma colcha de retalhos. Uma colcha bonita, quentinha, de ótima qualidade, mas ainda assim de retalhos.

Isso muda nos dois últimos episódios, que são os dois únicos que não possuem nenhum material reaproveitado de gravações anteriores. E meu amigo, que episódios! Eles são emocionalmente brutais, e mostram como o pior vilão para qualquer pessoa com super-poderes é alguém inteligente, sem escrúpulos e que assume as rédeas do poder.

Outra coisa que não posso deixar de citar aqui é a questão da violência: a Disney prometeu que a série seria extremamente brutal, e cumpriu em partes a promessa. Em partes porque, ainda que o que vemos em tela muitas vezes se aproxime do gore, com tripas e sangue voando, em alguns momentos a violência em exagero é abafada pela falta de consequências.

Por exemplo, o segundo episódio mostra uma luta incrível entre Matt Murdock e dois policiais corruptos dentro de um apartamento. A luta é insana de boa, mostra o herói espancando os dois policiais sem muitos problemas e termina com Matt jogando um dos policiais contra o chão. Nós vemos a cabeça dele batendo, vemos o pescoço dele torcendo, ouvimos o barulho de osso quebrando, e o corpo caindo todo torto e desacordado no chão. Quando a cena termina, nós temos uma certeza: aquele policial está morto.

Mas, no episódio seguinte, ele aparece andando pelo tribunal apenas com um olho roxo. E não é reaproveitamento de figurante: ele conversa abertamente com Matt Murdock sobre a surra que levou. Esse tipo de coisa também acontece no arco de episódios envolvendo o vilão Muse: a gente vê o vilão tirando do corpo das vítimas dele mais sangue do que o Shiryu precisa para consertar as armaduras de bronze, as todas elas recuperam a consciência após um descanso e um suquinho de laranja.

Então, a brutalidade meio que depende de qual personagem estamos falando: se é aplicada pelo Rei do Crime ou pelo Justiceiro, ela é real; se for por Matt, o Demolidor ou qualquer outro personagem, o resultado dela é minimizado. E aí criam-se alguns eventos absurdos que são normais pra quem jogou Batman: Arkham Knight e está acostumado a atropelar capangas com o batmóvel a 150km/h e o resultado ser apenas alguém “desacordado” porque o Batman não mata ninguém.

Felicidade por ver algo realmente bom

Mas pra mim o que vai ficar na memória de toda a temporada de Demolidor: Renascido não é um episódio ou evento da série, mas um sentimento. Um sentimento de felicidade genuína e infantil.

No último episódio, ocorre uma cena onde o Demolidor e o Justiceiro estão lutando juntos contra um bando de policiais. E a cena acontece exatamente como esse tipo de coisa ocorre nos quadrinhos: o Demolidor dando piruetas e usando golpes para desacordar os policiais “inocentes”, enquanto o Justiceiro esvazia o clipe da pistola na cabeça de um e arranca com as mãos as tripas de outro; o Demolidor gritando pro Justiceiro parar de fazer aquilo com aquelas pessoas, e o Justiceiro chamando o Vermelho de maricas; os dois brigando pela própria vida, enquanto discutem e se ajudam ao mesmo tempo – e que invariavelmente termina com eles pulando do telhado.

A cena é tão igual aos quadrinhos que eu cresci lendo e amando que de repente eu me peguei dando risada sozinho. Não porque o que estava acontecendo era engraçado, mas porque naquele momento eu voltei a ser o Rafa de 10 anos de idade, vendo os quadrinhos que sempre foram um escape da realidade saindo das páginas impressas e virando carne e osso ali, na minha frente. E esse é um sentimento que eu não tinha desde o final de Vingadores: Ultimato com qualquer coisa da Marvel.

Demolidor: Renascido era o primeiro grande desafio da Marvel este ano, e ela conseguiu se superar com honras. E agora eu estou genuinamente empolgado pelo que vem aí – principalmente se for a segunda temporada da série.

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** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal UAI.

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