Indie

Renato Degiovani, pioneiro dos games no Brasil, fala sobre seu 1º jogo no Steam

Amazônia 2020, versão atualizada de um dos primeiros games brasileiros, criado nos anos 80, chegará no Steam na metade deste ano. A informação foi dada em primeira mão por Kao Tokio neste Drops de Jogos em março.

Renato Degiovani, pioneiro da cena e autor do jogo, sempre comercializou suas produções através de revistas (Micro Sistemas) e em um sistema autoral (TILT.net).

Com 63 anos, depois de criar muita coisa, hoje o pioneiro dos games BR vai entrar na maior varejista digital de games no mundo.

Padrinho do Drops de Jogos, Renato nos concedeu uma entrevista. Veja.

Drops de Jogos: Após tantos anos de Micro Sistemas, TILT.net e iniciativas próprias, por que lançar no Steam só agora?

Renato Degiovani: Primeiro porque sempre fui cobrado pelos amigos de que deveria estar no Steam e que inclusive há lá uma seção só para adventures de texto. Segundo, quando o [desenvolvedor Marcus] Garrett me falou sobre o lançamento do Aventuras na Selva e do Amazônia nos dias de hoje, pensei: por que não dar uma repaginada, adicionar umas coisas legais e ir inclusive para o mercado internacional?

Sempre defendi que a gente tem que experimentar todos os modelos comerciais para ver qual se adapta melhor aos nossos propósitos.

DJ: Como você enxerga os devs brasileiros no Steam?

RD: Gostem ou não, os games BR no Steam raramente atingem o patamar médio do resto do planeta, em termos de “owners” – o desempenho médio fica na faixa dos 200 mil até 500 mil.

Isso seria um número modesto razoável, dada a quantidade de opções similares. Os jogos br raramente passam da faixa 0 até 20 mil.

Inclusive jogos de empresas consideradas top no Brasil e games vencedores de prêmios nos eventos.

Não vejo nenhuma vantagem ou desvantagem expressiva na loja do Steam mas sim nos devs que apostam todas suas fichas nela. A indústria brasileira meio que esqueceu (ou não aprendeu) como vender jogos.

Ou é isso ou é comodidade mesmo.

DJ: Renato, por que você está revisitando títulos dos anos 80, dos primórdios da indústria brasileira, em 2020?

RD: Faz tempo que eu me dei conta que fui negligente com a minha obra como um todo.

Só agora criei vergonha na cara para organizar esses jogos. Veja só como são as coisas: sempre que alguém fala do Amazônia, usa um vídeo de uma versão só texto, feita pro MSX nos anos 80.

E o Amazônia não é um adventure text only desde o começo dos anos 90. Além disso, fica parecendo que eu só fiz isso e fui viver de royalties, mas ninguém menciona Serra Pelada, Angra-I, Resgate na Serra do Roncador, Moscão Killer, Torpedo, Aeroporto, Guerra no Golfo, Mensalão, Fungolóies, Zoid Patrol, Mago das Ervas, RPG chat, Pedra Negra e tantos outros.

Eu nem me lembro de cabeça de todos eles.

Achei que era hora de organizar pelo menos os meus jogos mais relevantes em uma espécie de catálogo. Claro, usando o Micro Aventuras pra isso.

DJ: Quais games brasileiros chamaram sua atenção neste ano?

RD: Se por chamar a atenção você se refere a querer jogar independentemente de ter sido indicado por alguém, eu diria que em 2020 o único jogo BR que eu olhei e disse vou comprar e jogar foi o Star Valor.

Outros jogos eu até posso ter jogado, mas a grande maioria eu passo batido mesmo. Se o game não me atrair logo de cara por algum motivo, vai pro limbo das referências.

DJ: Esse período de crise de coronavírus pode ser propício para vendas digitais de games?

RD: Eu acho que a gente está longe de saber o que vai ser bom ou ruim nesse período.

Todo mundo que eu conversava antes achava que ia ter um boom de atividades online, mas eu não vejo isso acontecendo. Eu mesmo não me interessei por nada que não fazia antes, mesmo tendo ofertas e mais ofertas de cursos que eu até me interessaria em fazer.

Durante essa quarentena, deu preguiça.

DJ: Além de relançamentos de jogos, quais são seus futuros projetos?

RD: Eu não parei desde 1980 quando comecei, então sempre tenho algo novo em desenvolvimento. Sem contar os projetos que ficaram dormindo na gaveta e que podem aparecer a qualquer hora.

Nos últimos dias tenho trabalhado no Micro Bug, que não chega a ser um relançamento ou uma revisitação mas me apropriei de uma ferramenta que criei nos anos 80, para a Micro Sistemas.

Era para fazer um interpretador BASIC simples e limitado (como era nos anos 80) voltado para as crianças e pessoas que nunca programaram. Serve para que possam “brincar” de criar programinhas em BASIC e aprender a lógica por trás dos programas.

É a melhor forma de entender como os programas funcionam.

Além disso ele vai ser mais um brinde no pacotão de relançamento do Amazônia 2020, junto com uma edição impressa da Micro Sistemas.

DJ: Tem algo que eu não perguntei e você gostaria de falar?

RD: A única coisa que eu gostaria de dizer é que a gente precisa com urgência começar a tratar a produção brasileira com mais informações concretas e menos oba oba.

Tem muita gente acreditando ainda que basta ir para o Steam ou pegar uma grana de edital que o resto vem na correnteza. A geração anos 2010, em especial dos anos 11, 12 e13 estão praticamente sumindo do mapa e a nova geração, anos 18/19/20, não parece ter aprendido bem as lições da geração anterior.

Acho que isso vem do fato de não querermos olhar para o mercado como ele de fato é. É uma pena que isso aconteça, já que o potencial do Brasil, tanto para fazer quanto para consumir jogos brasileiros, é imensa.

Pedro Zambarda

É jornalista, escritor e comunicador. Formado em Jornalismo pela Faculdade Cásper Líbero e em Filosofia pela FFLCH-USP. É editor-chefe do Drops de Jogos e editor do projeto Geração Gamer. Escreve sobre games, tecnologia, política, negócios, economia e sociedade. Email: dropsdejogos@gmail.com ou pedrozambarda@gmail.com.

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