Análise: Integrantes do mercado de games, dentro e fora do Brasil, precisam de melhores condições de trabalho - Drops de Jogos

Análise: Integrantes do mercado de games, dentro e fora do Brasil, precisam de melhores condições de trabalho

O jornalista Jason Schreier, autor do livro "Sangue, Suor e Pixels", sobre desenvolvimento de jogos, publicou uma ótima reportagem no Kotaku no começo de abril sobre a criação de Anthem. Ele explica no texto como a nova propriedade intelectual da BioWare "deu errado".

Foto: Reprodução/New York Times

Na reportagem, ele evidencia as más condições de trabalho do estúdio vinculado com a EA. "Talvez o mais alarmante, é uma história sobre um estúdio em crise. Dezenas de desenvolvedores, muitos deles veteranos de uma década, deixaram a BioWare nos últimos dois anos. Alguns que trabalharam no escritório mais antigo da BioWare em Edmonton falam sobre depressão e ansiedade. Muitos dizem que eles ou seus colegas de trabalho precisaram tirar uma 'stress leave' – um período obrigatório a pedido do médico de semanas ou até mesmo meses de férias para sua saúde mental. Um ex-desenvolvedor da BioWare me disse que ele frequentemente encontrava uma sala privada no escritório, fechava a porta e simplesmente chorava. 'As pessoas ficavam com muita raiva e tristeza o tempo todo', ele disse. Outro falou: 'Depressão e ansiedade são uma epidemia dentro da Bioware'".

"'Eu realmente não consigo contar a quantidade de 'vítimas de estresse' que tivemos em Mass Effect: Andromeda ou Anthem', disse um terceiro ex-desenvolvedor da BioWare por e-mail. 'Uma 'vítima de estresse' na BioWare significa que alguém teve um colapso mental tão grande por estresse que eles simplesmente se vão por um a três meses. Alguns voltam, outros não'".

Ontem foi feriado do Dia do Trabalho no Brasil e no mundo, data marcada por protestos sindicais. Num mundo rodeado pela tecnologia, com menos presença de Estados e governos, a questão das condições dos empregos voltaram a ter uma atualidade e o que Jason relata não é exatamente uma novidade. Desde 2018 é debatido a criação de forças sindicais no mercado de jogos nos Estados Unidos, impulsionado por jornalistas de publicações como Polygon. Uma iniciativa chamada Game Workers Unite aglutina discussões internacionais sobre o tema. 

Depois de publicar a reportagem sobre Anthem, Jason Schreier publicou um artigo no New York Times defendendo a necessidade de formação de sindicatos. Cita os casos de "crunch" e condições de trabalho degradantes em games como Fortnite e Call of Duty. Red Dead Redemption 2, citado como o melhor game do ano passado, também foi alvo de acusações de abuso por parte dos trabalhadores envolvidos.

Sam Dean, no Los Angeles Times, também publicou um artigo que reforça os mesmos argumentos colocados por Jason.

Reação às demissões e enriquecimento

O debate não é por acaso. Embora os lucros da indústria de jogos eletrônicos sejam calculado em bilhões, as ferramentas estejam cada vez mais acessíveis e exista muita competição, nem sempre os trabalhadores são os beneficiados.

A Activision-Blizzard demitiu mais de 700 empregados no começo de 2019. A dispensa ocorre quando os executivos da Activision e da EA são os mais bem pagos da indústria a nível global, entre os 100 maiores dos Estados Unidos.

Bobby Kotick, da Activision, é o presidente mais bem pago da indústria de jogos dos EUA e recebe anualmente uma quantia que corresponde a 306 vezes o salário médio dos funcionários da empresa. No ranking, ele ficou no 45º lugar da lista.

Já Andrew Wilson, da EA, ficou no 98º lugar da lista, com salário cujo valor é multiplicado 371 vezes em relação ao de outros funcionários.

Isso explica muito sobre as críticas que a mídia faz sobre a EA, mas a discussão precisa aprofundar no caso das condições de trabalho.

Um tabu no Brasil

Com uma discussão predominantemente liberal e mais à direita na mídia brasileira, o assunto foi pouco abordado no Brasil. Boa parte do empresariado nacional, fora do mercado de games, rechaça a discussão sobre sindicalização e os últimos dois governos retiraram financiamentos via impostos de organizações trabalhistas.

A indústria de jogos brasileira nem de longe tem a qualidade robusta da norte-americana ou da japonesa, mas há mais de 300 empresas em operação no país segundo o Segundo Censo do setor divulgado em 2018.

A discussão, concordando ou não sobre maiores condições trabalhistas de empregados, incluindo 13º salário, CLT e benefícios históricos no Brasil, precisa chegar no setor do entretenimento eletrônico aqui. Lá fora, onde também o liberalismo dominou o setor, o desgaste dos trabalhadores fez com que a mídia norte-americana se mexesse para denunciar abusos.

Não se trata apenas de opinião. Há dados sobre demissões em massa e desigualdade dentro do mercado.

As informações estão postas, faltam providências para evitar uma crise maior na indústria.

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** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal UAI.

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