Às vezes nosso cérebro resolve que vai funcionar do jeito errado e não há nada que você pode fazer sobre isso. E Arcade Paradise me faz sentir essa sensação.
Lançado em 2022, o game da Nosebleed Interactive é um “simulador de negócios” um tanto diferente. No papel de um jovem com muitos sonhos mas sem nenhuma confiança em si mesmo, você deve provar seu valor a um pai ausente e que sempre colocou o dinheiro acima da família. Como? Gerenciando uma lavanderia dele que estava abandonada.
Seu papel aqui é bem simples: pegue o cesto de roupas sujas dos clientes, coloque na máquina, espere passar o ciclo, transfira as roupas do secador, espere finalizar o ciclo, e entregue as roupas limpas e secas para os clientes. E nos tempos de espera, recolha qualquer lixo largado pelo prédio e garanta que o banheiro não está entupido.,
Moleza né? Como o seu próprio pai diz em uma mensagem de voz, até um fracassado como você consegue dar conta do trabalho.
Mas essa lavanderia tem um quartinho dos fundos abandonado, que ninguém consegue nem ver da rua, e você tem uma ideia genial: porque não colocar uns fliperamas ali e ganhar uns trocados a mais dos clientes que vem na lavanderia? Pelos seus cálculos, o lucro dessas máquinas pode até superar o da lavanderia no futuro.
Claro, o seu pai não aceita a sugestão. Mas ele mora em outro continente, e você toma a decisão de colocar umas máquinas de fliperama nos fundos da lavanderia de qualquer jeito.
E este é o looping principal de Arcade Paradise: levantar grana cuidando da lavanderia, equipar um fliperama e, com o tempo, tornar o seu negócio cada vez mais um fliperama e menos uma lavanderia.
E os dois negócios não podiam ser mais distintos: enquanto a lavanderia é a quintessência daquilo que as pessoas chamam de “trabalho de verdade” (você é pouco recompensado por um trabalho duro, repetitivo e de mínimo esforço intelectual), o fliperama funciona como um trabalho na indústria criativa. Ele ainda é um pouco repetitivo (afinal, você precisa manter o lugar limpo), mas exige muito mais da sua capacidade intelectual para tornar o lugar popular.
E mesmo que no começo o fliperama pague menos do que o trabalho na lavanderia, você tem a perspectiva de que esse esforço irá compensar no futuro, onde ele se tornará muito mais lucrativo do que lavar roupas.
(Claro, esse é tipo o “melhor cenário” de quem trabalha na economia criativa. A realidade é que muita gente acaba abandonando o sonho do fliperama para trabalhar na lavanderia porque precisa pagar as contas).
Arcade Paradise me viciou do jeito errado
Todas as mecânicas do jogo são feitas para dar ênfase ao conceito de que o fliperama rentável é o seu objetivo final. E, conforme você vai avançando na história do jogo, chega até mesmo um momento que o prédio todo se torna um fliperama.
E é aí que eu percebi que tinha um problema.
Arcade Paradise foi o primeiro jogo em muito tempo que me fez ficar acordado até às 4h da matina porque fiquei tão focado nele que nem percebi o tempo passando. O looping de lavar roupas, retirar o lixo e, nos minutinhos de espera entre um ciclo e outro, jogar uma partidinha rápida nos fliperamas do fundo da lavanderia me fizeram amar esse jogo de um jeito que fazia tempo que eu não amava nenhum game.
Mas aconteceu uma coisa engraçada: quanto mais eu avançava no jogo, menos eu gostava dele. E tudo porque eu precisei passar cada vez menos tempo lavando roupas e mais jogando videogame. E eu sei que isso é uma frase absurda de dizer, principalmente porque faz dois dias que minha máquina de lavar roupa está cheia e eu não botei ela pra bater ainda porque estava muito concentrado em lavar roupas e cronometrar ciclos de lavagem no videogame.
Ah, que saudade da minha lavanderia… (Imagem: divulgação/Nosebleed)
Mas infelizmente essa é a verdade do meu cérebro de lagarto: em um jogo que me oferece dezenas de minigames no formato de um prédio de fliperamas totalmente jogáveis, com games incríveis como Barkanoid (Arkanoid só que com um cachorro salsicha brincando com uma bolinha de tênis), Race Chaser (uma mistura de Pac-Man com GTA) ou mesmo a boa e velha mesa de sinuca.
Mas mesmo com literalmente dezenas de jogos para passar o tempo, o que meu cérebro de lagarto quer é pegar um cesto de roupas sujas, colocar na máquina, esperar o fim do ciclo, passar as roupas para a secadora, esperar o fim do ciclo, pegar as roupas limpas e entregar para o cliente.
E com dezenas de máquinas para jogar no endgame, eu estou fixado na primeira que instalei nos fundos da lavanderia: Stack Overflow, um jogo sobre empilhar caixas da mesma cor que é o minigame mais próximo de ser um trabalho repetitivo e de baixa exigência mental que eu tenho acesso.
Eu tenho certeza que os devs de Arcade Paradise esperavam viciar as pessoas no sonho que é ganhar uma boa grana jogando videogames. Mas eu viciei do jeito errado; eu viciei no trabalho repetitivo e mal remunerado de uma tarefa que não exige absolutamente nenhum esforço do meu cérebro.
Arcade Paradise foi lançado em 11 de agosto de 2022 para para PS4, PS5, Xbox One, Xbox Series X|S, Nintendo Switch, PC e Luna. O game faz parte das bibliotecas do Game Pass, da PS Plus Extra e da PS Plus Deluxe.
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** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal UAI.