A decisão suicida da Unity - e um preocupante sinal na indústria de games. Por Pedro Zambarda - Drops de Jogos

A decisão suicida da Unity – e um preocupante sinal na indústria de games. Por Pedro Zambarda

Reações enfurecidas – e com razão

Fogo na Unity. Foto; Divulgação/Drops de Jogos/Montagem

Fogo na Unity. Foto; Divulgação/Drops de Jogos/Montagem

Por Pedro Zambarda, editor-chefe do Drops de Jogos.

A empresa responsável pelo motor gráfico Unity anunciou, no dia 12 de setembro de 2023, que passaria agora a cobrar desenvolvedores de jogos uma taxa pelos downloads. A nova “taxa de instalação” seria aplicada a projetos que registraram um patamar mínimo de receitas nos últimos 12 meses.

A companhia afirmou que ia cobrar sua taxa mensalmente, sendo que o valor dependeria do tipo de licença que cada game usou. Enquanto aqueles que usam os planos Pessoal e Plus iriam pagar 20 centavos por instalação, quem tem o plano Pro iria começar pagando 15 centavos, taxa que pode cair pra 0,02 centavos dependendo da popularidade de um projeto. Já aqueles do plano Enterprise começariam pagando 12,5 centavos, sendo que esse valor poderia cair para até 0,01 centavo por instalação.

O CEO da Unity, John Riccitiello, vendeu cerca de 2 mil ações da empresa no dia 6 de setembro, dias antes de a nova política ser anunciada. Riccitiello fez parte da Electronic Arts, a EA, sua ação poderia ser enquadrada como insider trading, o que é um possível crime de especulação no mercado financeiro. Outros executivos da Unity tomaram providência similares.

O que eles não contavam? A reação de indies e até de estúdios grandes e de grandes publishers. O site Game Developer, ligado à GDC, logo manchetou: “A morte do Unity“.

Publicou um longo artigo citando como os desenvolvedores de grandes sucessos como Vampire Survivors seriam penalizados financeiramente por seus sucessos comerciais. Games acessíveis para compra por um preço baixo poderiam subir seus preços para pagar a taxa.

E para onde iria a arrecadação da taxa da Unity? Para desenvolvimento de inteligência artificial (IA) e não para melhorar a cena internacional de jogos do ponto de vista da inclusão dos independentes, os indie.

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Fogo na Unity. Foto; Divulgação/Drops de Jogos/Montagem

Fogo na Unity. Foto; Divulgação/Drops de Jogos/Montagem

Possibilidade de lesar empresas

A pesquisa da indústria brasileira de games de 2022, produzida nacionalmente pela Homo Ludens com a ABRAGAMES, aponta que 83% dos desenvolvedores nacionais criam jogos pela Unity. 23% fazem pela Unreal, da Epic Games. Blender Engine estão em 13%, enquanto Construct fica em 11%.

As engines são seguidas por GameMaker (7%), Godot (que despontou como opção ao Unity, em 7%), engine própria (7%), Cocos 2D (4%), Corona SDK (1%), Phaser (1%), CryEngine (1%), Amazon Lumberyard (1%) e outros (9%).

Tanta adesão traz um medo: Mudar as políticas e taxar os devs pode lesar empresas indie brasileiras. No limite, uma microempresa individual pode ter riscos se um game tiver muitas instalações. E, veja, a Unity não propõe uma taxa por percentual de venda. Propõe taxar a instalação do software, o que pode criar ainda mais distorções no mercado, que já foi afogado por microtransações de jogos grandes da própria EA.

Criada em 8 de julho de 2005, com 18 anos de estrada, a Unity se popularizou pela sua gratuidade e por permitir portar games com facilidade tanto para dispositivos móveis quanto consoles. O autor deste texto entrou no mercado de games como assessor de imprensa em 2008. O boom de desenvolvedoras indie no Brasil muito se deu por causa da Unity.

Ela democratizou o desenvolvimento de jogos – e agora provoca uma reação enfurecida.

O pedido de desculpas que ninguém acredita

No dia 17 de setembro, a Unity declarou o seguinte no Twitter.

Nós ouvimos vocês. Pedimos desculpas pela confusão e angústia causada pela política de taxas por tempo de instalação dos games que anunciamos na terça-feira. Estamos ouvindo e conversando com os membros da nossa equipe, comunidade, clientes e parceiros e faremos alterações na política. Compartilharemos uma atualização em alguns dias. Obrigado pelo seu feedback honesto e crítico.

Quem consegue acreditar nisso? No dia seguinte, o jornalista Jason Schreier na Bloomberg apontou que o Unity limitará as taxas a 4% da receita de um jogo para clientes que ganhem mais de US$ 1 milhão e que as instalações contadas para atingir o limite não serão retroativas.

Ou seja, a taxa vem ai. Talvez menor do que se espera e mais voltado para grandes jogos.

Sinais de uma crise maior

Estou longe de afirmar que a indústria de games vai acabar (o que seria um completo exagero), mas claramente ela está em crise. Mesmo com muitos downloads e transmissões ao vivo na pandemia entre 2020 e 2022, os efeitos reais das mortes pela Covid-19 chegaram na economia. E isso se traduz até na configuração do próprio mercado.

A Microsoft comprou a Activision Blizzard por US$ 68,7 bilhões (aproximadamente R$ 379 bilhões) em 18 de janeiro de 2022. A aquisição ocorre num contexto de Guerra da Ucrânia e da retirada de parte dos investimentos de parte da Europa.

O mercado de games segue se expandindo e investindo em recursos que buscam substituir a mão-de-obra humana, como a IA. Não a toa, os trabalhadores do setor sentem os efeitos desse cenário. Salários achatados, ausência de sindicalização no próprio Brasil, por exemplo.

Nos EUA, que tem o setor de entretenimento mais sindicalizado, cogita-se uma greve no setor de jogos.

Sinais de crise.

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** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal UAI.

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